Programa
Ciclo de palestras e debates que abordam, em seis encontros, os conflitos sociais evidenciados em piadas veiculadas na televisão e na internet.
15/04 – Breve panorama do humor brasileiro
O que é o humor? Quais os principais aspectos da sensibilidade cômica moderna? Quem são seus alvos preferenciais e a quem - e sob que circunstâncias - é permitido fazer piada? Tratado como uma constante antropológica, mas histórica e socialmente relativo, o humor revela uma multiplicidade de formas e usos que vão desde o controle e exclusão social, passando pela ridicularização e transgressão de costumes, valores e crenças, à mitigação do stress e da ansiedade característicos da condição moderna. Seja como loucura travestida de razão, seja como razão travestida de loucura, compreender o fenômeno cômico é compreender os limites e possibilidades da condição humana em contextos específicos.
Existe uma vocação cômica da cultura brasileira? É preciso reconhecer inicialmente que os procedimentos humorísticos e as técnicas que produzem o riso – expectativas que redundam em surpresas, o timing da piada, o gancho da situação risível – são universais – mas a linguagem humorística, aquela espécie de irreconhecível sintaxe silenciosa que se coloca por trás de toda comédia, é peculiar a cada povo e a cada cultura.
A linguagem humorística brasileira se caracteriza, entre muitas outras coisas, pela paródia. Mas não é uma paródia no sentido original do termo, que é de “canto paralelo”. Mais do que isto, é uma paródia da própria realidade, que o crítico Paulo Emílio Salles Gomes vislumbrou ao dizer que a chanchada resultava daquela “nossa incapacidade criativa de copiar”. A vida do brasileiro é tão cheia de incongruências que para rir basta fazer uma paródia da vida real. A linguagem humorística brasileira nasce como forma de catarse de uma sociedade de excluídos, baseada no personalismo recalcado, que esconde uma ansiedade medrosa da impessoalidade abstrata da lei.
Com Cynthia Hamlin e Elias Thomé Saliba.
17/04 – Humor na televisão
A televisão vive hoje a urgência de renovar seus quadros de modo a competir com o dinamismo da internet. Há futuro para o humor na televisão?
Muito antes da internet, a televisão (e antes dela o rádio) tem sido a principal difusora de programas humorísticos. O largo uso de elementos oriundos do rádio, como os bordões, frases de efeito e roteiros repetitivos, além de práticas circenses consagraram programas como a Escolinha do Professor Raimundo (Chico Anysio), Viva o Gordo (Jô Soares) e os Trapalhões (Renato Aragão e cia.). TV Pirata e Casseta e Planeta são exemplos de humorísticos bem sucedidos que fogem dessa “regra”.
Nesse encontro, Ana Lucia Enne e Marina Caminha abordam as narrativas cômicas como ponto de partida para analisar o processo de engajamento afetivo entre representações televisivas e telespectador, avaliando a maneira como o riso televisivo deixa brechas para entendermos as mudanças em nossas experiências comportamentais, ou seja, o modo como passamos a fabular o entendimento que temos de nós mesmos e dos outros.
Com Ana Lucia Enne e Marina Caminha.
20/04 – O riso dos outros
O humor tem tido presença constante nas mais distintas instâncias de nossa vida cotidiana atual (os métodos pedagógicos devem ser divertidos, a maioria das propagandas publicitárias investe em uma abordagem humorística, dentre tantas outras) e, nas últimas décadas, o chamado “humor politicamente incorreto” ganhou destaque e tem gerado inúmeras discussões acerca dos limites do humor, do que poderia ser considerado humorístico ou não e, evidentemente, os conflitos desse tipo de humor com um, por vezes suposto e por vezes factível, policiamento do politicamente correto. Frente a essas questões propomos a reflexão de como o humorismo politicamente incorreto é constituído e suas dialéticas possibilidades de produzir sentidos, seja ao reforçar ou atacar a ordem estabelecida.
Dirigido por Pedro Arantes, o documentário O Riso dos Outros aborda o humor politicamente incorreto a partir de entrevistas com personalidades como os humoristas Danilo Gentili e Rafinha Bastos, a cartunista Laerte e o deputado federal Jean Wyllys. Nesse encontro, a exibição do documentário seguida de debate, propõe compreender o humor politicamente incorreto, os impactos que produz no corpo social e os paradoxos envolvidos.
Com Mateus Pranzetti Paul Gruda e Pedro Arantes.
22/04 – Humor na internet e limites da liberdade de expressão
A Internet provocou uma profunda transformação na produção de conteúdo humorístico, na medida em que possibilita a sua divulgação sem o crivo de um controle editorial organizado. A facilidade de disponibilização e de acesso a piadas (seja em qualquer suporte ou mídia) permitiu o surgimento de produtores deste tipo de conteúdo independentemente da indústria tradicional do entretenimento. Isso dinamizou o segmento, que hoje conta com uma audiência expressiva. Nem sempre esses conteúdos são bem recebidos. Temas sensíveis abordados de forma jocosa, como os de cunho religioso ou político, dão bons exemplos de como o humor pode incomodar. Esta aula pretende explorar os limites da liberdade de expressão para a criação e divulgação de piadas na Internet, o que será feito por meio de casos que chegaram à mídia e ao Poder Judiciário. Embora o debate passe por uma perspectiva jurídica, a ideia também é refletir sobre os conceitos de difamação e de “politicamente correto” de uma maneira mais ampla.
Com Dennys Antonialli.
24/04 – Psicanálise e humor judaico
Tradicionalmente, o humor judaico mais difundido ente nós representou uma saída triunfante frente às adversidades sofridas pelo povo judeu – advindas do ambiente hostil encontrado na Europa Oriental antissemita da segunda metade do século XIX. Nesse sentido, desidealizar ou rebaixar o adversário contribui para o enaltecimento e a sobrevivência do sujeito. Ri melhor quem ri por último, diz o adágio. O alvo das centenas de piadas que surgiram naquele tempo foram, naturalmente, os antissemitas, mas não apenas: tipos sociais da própria comunidade, hábitos, crenças tidas por ingênuas, a pretensão de certas autoridades espirituais, entre outros temas, serviram como objeto deste gênero de crítica social.
Com o fim daquela era, o humor transplantou-se para outros lugares, especialmente os Estados Unidos, que atualmente abrigam a maior comunidade judaica do mundo. Este movimento coincidiu com o inicio da moderna indústria do entretenimento, na qual a participação dos judeus tem sido intensa (basta lembrar os nomes de Groucho Marx e de Woody Allen). Se os objetos de riso mudaram, terá mudado também a função do humor judaico na contemporaneidade? A aula examinará essa questão por meio da contação de piadas.
Com Renato Mezan e Daniel Kupermann.
27/04 – O humor empoderado
Nesse encontro serão apresentadas e discutidas duas experiências nas quais grupos tradicionalmente alvos de piadas usam o humor na internet para questionar preconceitos sociais: os humorísticos Põe na Roda e Tá bom pra você?.
Criado há menos de um ano, o Põe Na Roda já é atualmente o maior canal do Youtube de humor e informação sobre cultura gay. O canal, com mais de 200 mil usuários inscritos e somando mais de 12 milhões de visualizações, atrai todo tipo de público, mesmo heterossexual, que se diverte e se informa semanalmente com os vídeos e temas abordados.
Tá bom pra você? é um humorístico que satiriza peças publicitárias e situações cotidianas marcadas pela invisibilidade do negro e estereótipos raciais. Os episódios – muitos são referências a formatos clássicos de propagandas como as famílias perfeitas dos comerciais de margarina – são protagonizados pelos atores Érico Brás, Kênia Dias e os filhos do casal. A ideia surgiu a partir de uma discussão familiar sobre a ausência do negro na mídia.
Com Pedro HMC e Djamila Ribeiro.
(Foto ilustrativa: Gargantua - Honoré Daumier, 1831)
As inscrições pela internet podem ser realizadas até um dia antes do inicio da atividade. Após esse período, caso ainda haja vagas, é possível se inscrever pessoalmente em todas as unidades. Após o início da atividade não é possível realizar inscrição.
Palestrantes
Bibliografia
Humor é veneno ou remédio? (Daniel Kupermann)
Disponivel em: http://www1.folha.uol.com.br/opiniao/2015/03/1602535-daniel-kupermann-humor-e-veneno-ou-remedio.shtml