Culturas e identidades do trabalho

A despeito dos avanços tecnológicos que ocorreram na produção sucroalcooleira brasileira, permanece quase inalterada a imagem da precariedade sempre associada ao trabalho no corte de cana. Se parece válido supor que as condições estruturais que organizam esse tipo de trabalho definem e limitam o horizonte, a maneira de agir, dos que nele atuam, por outro lado, isso deixa na penumbra, ou não nos diz nada a respeito de como o homem vivencia, experimenta, interpreta essa limitação. Em nível sociológico, o tratamento dado a essa percepção da “exploração”, dos estigmas e das identidades que estão em disputa nesse contexto (“camponês”, “trabalhador rural”, “assalariado”, “cortador de cana”) deixa entrever a maneira como os indivíduos, em suas ações cotidianas, elaboram pequenos cálculos para as suas decisões e fazem escolhas à luz do que interpretam. Trata-se, portanto, de analisar os microfundamentos que sustentam a mecânica dessas formas de apropriação do trabalho. Para dar consequência a essa proposta de análise, o estudo de campo focalizou o Estado de Sergipe. Uma área canavieira que, a despeito de estar integrada ao setor sucroalcooleiro nacional, situa-se fora do que metaforicamente poderíamos chamar de “o olho do furacão”, ou seja, que se encontra fora das grandes regiões produtoras. O desafio era recolocar as questões já feitas nessas regiões, tais como a migração, os processos de trabalho, o perfil dos trabalhadores e observá-las a partir de uma zona de retomada da produção. A pesquisa de campo lançou mão do registro etnográfico dos espaços trabalho e da realização de trinta entrevistas biográficas com os trabalhadores selecionados para a composição da amostra.