Entrevista com Danilo Santos de Miranda
Diretor Regional do Sesc no Estado de São Paulo
De que forma a realização do Curso Sesc de Gestão Cultural se insere nos propósitos e ações programáticas da instituição?
Somos uma instituição claramente vinculada a uma proposta de política cultural. Nesse sentido, a realização do
Curso Sesc de Gestão Cultural coaduna com os propósitos de estarmos presentes e colaborarmos com o desenvolvimento da área da cultura no país.
Como instituição voltada ao bem estar, à qualidade de vida, à valorização da cidadania e ao desenvolvimento de uma sociedade mais participativa e crítica, adotamos a cultura como elemento-chave num processo educativo permanente.
De que forma a experiência do Sesc, acumulada ao longo de mais de 60 anos de atuação na área da cultura, integrará as atividades do curso?
O lançamento do Curso Sesc de Gestão Cultural está relacionado à proposta da instituição de olhar para dentro e para fora. Internamente, o Sesc qualifica gestores para o desenvolvimento de suas funções. Verificamos, porém, a necessidade de partilhar esse conhecimento, trazendo ao público interessado a possibilidade de entrar em contato com essa realidade. Há algum tempo, percebemos a demanda pela ampliação da presença de profissionais qualificados nos organismos públicos ou privados ligados à cultura e esse debate pode contribuir de forma significativa com esse processo.
Queremos acrescentar aos esforços que vem sendo realizados dentro e fora do país a contribuição de uma instituição que não é acadêmica, mas entra nesse campo com o conhecimento e a fundamentação do seu próprio trabalho, da sua própria experiência e do seu dia a dia. É uma iniciativa nova que tem sido bem recebida por pessoas e organizações que vêem o Sesc como instituição com uma grande contribuição a dar.
Qual a importância do compartilhamento da experiência do Sesc na área cultural com gestores de outras instituições? Como você vê essa troca?
Esse é o grande diferencial do Curso Sesc de Gestão Cultural. Hoje, nós temos a prática e buscamos, cada vez mais, aprofundar a teoria, usando todo o parque acadêmico à disposição. Temos colegas atuando como alunos de mestrado, doutorado, e até como professores, porque esse compartilhamento é absolutamente vital.
O Sesc de São Paulo, ao realizar discussões e debates a partir de sua experiência, de seu dia a dia e de suas 33 unidades operacionais voltadas a ações de caráter cultural, com pessoas muito experientes, reúne uma massa crítica de tal ordem que, se desperdiçada, cometeria uma irresponsabilidade. Trata-se, portanto, do cumprimento de uma missão institucional.
Dividir esse conhecimento com pessoas da própria instituição e com pessoas de fora, que já têm algum tipo de experiência e vem buscar no Sesc o nosso modo de fazer, vai, certamente, representar um avanço, tanto para nós como para aqueles que vem buscar nossa colaboração.
Há carência de cursos de formação e qualificação em gestão cultural?
Sim, há carência com relação a cursos dessa natureza no país inteiro e, talvez, até fora. Por outro lado, verifica-se a ampliação desse quadro. Há cada vez mais instituições e organizações voltadas a esse mundo do imaterial, da valorização cultural, e que percebem a importância da educação e do conhecimento no dia a dia das pessoas.
Uma das prioridades do Ministério da Cultura é a qualificação dos gestores culturais por meio da parceria entre o Executivo Federal e instituições formadoras como universidades, fundações e institutos, que deverão formar a Rede de Instituições de Formação em Gestão Cultural. De que forma a realização do Curso Sesc de Gestão Cultural se insere nesse contexto?
Para mim, a questão cultural é inerente à vida de uma sociedade, independentemente dos esforços realizados pelo Estado. Mas, certamente, nos últimos anos, tivemos uma evolução no plano oficial, e essa discussão começou a fazer parte da pauta do Ministério da Cultura de maneira um pouco mais cuidadosa. De um tempo para cá, noto, claramente, um desejo mais profundo de discutir a importância da cultura na sociedade, seja por parte do ministério, das secretarias de nível municipal, das secretarias de nível estadual ou de outros órgãos públicos.
O Ministério da Cultura contribui com esse processo por meio da criação de uma política nacional, do Sistema Nacional de Cultura, envolvendo a nação inteira numa perspectiva mais aprofundada dos mais diversos aspectos da questão cultural.
Existe, portanto, uma grande mobilização nos diversos campos da cultura. O Sesc, que é, talvez, a maior estrutura cultural do país do ponto de vista da sua presença, abrangência, permeabilidade e capilaridade, não pode ficar de fora. Ainda mais o Sesc de São Paulo, que é pioneiro dentro do próprio Sesc nessa perspectiva.
Levando em conta todo esse quadro, que, antes, não existia, e revela uma nova consciência, a pergunta que devemos nos fazer é: Como contribuir? Como aprofundar esse processo?
Ações que temos feito nessa área são importantes, mas não suficientes. Agora, damos um passo a mais organizando esse curso de gestão, que tem uma característica muito mais prática e objetiva do que propriamente regulamentada. Para nós, a regulamentação oficial do Ministério da Educação é menos importante. Esse é um passo, quem sabe, futuro. Por enquanto, temos a homologação do Sesc de São Paulo.
Em que consiste o trabalho do gestor cultural? Quais as principais qualidades que um gestor deve reunir para atuar no campo da cultura?
Em primeiro lugar, o gestor deve ter uma sólida formação cultural. Há alguns anos, criamos mecanismos oferecendo ao público uma contribuição nesse sentido. É o caso, por exemplo, de publicações como o “DICIONÁRIO SESC A linguagem da cultura”, onde tentávamos definir, de maneira bastante ampla, temas do vocabulário que compõe o universo da cultura. A publicação, organizada por Newton Cunha e editada em conjunto com a Editora Perspectiva, está disponível e tem um importante papel de formação, uma vez que oferece, também para o público externo, um material informativo usado internamente no Sesc, já antecipando esse esforço de discutir abertamente a questão cultural.
Com a implantação do Curso Sesc de Gestão Cultural, estamos dando um passo muito maior, pois iremos oferecer ao grande público a oportunidade não apenas de um aprofundamento, mas, inclusive, de um questionamento a respeito desse profissional do campo da cultura: Quem é ele? O que se espera dele? Qual a perspectiva que temos?
Por conta de suas ações, o Sesc tem algumas respostas. O que esperamos de um gestor cultural? Esperamos conhecimento, competência técnica, capacidade de se envolver de maneira inteligente com o público à sua volta e de entender a comunidade, além de habilidade política e inteligência para lidar com todos os demais agentes envolvidos no processo.
As qualificações necessárias são abrangentes, mas partem, fundamentalmente, do conhecimento da área, que envolve muita leitura e permite o entendimento tanto das coisas que estão acontecendo quanto as suas justificativas. É importante haver um conhecimento amplo, mas não superficial, da realidade cultural de nossa civilização.
Nosso entendimento de cultura, porém, abrange não apenas esse conhecimento básico, mas, também, um compromisso de ordem ética. Nesse sentido, o gestor cultural, deve adotar uma prática saudável, baseada na ética e no respeito. Para nós, esse componente ético da cultura é fundamental. Eu sempre relaciono estética e ética, vinculando cultura e educação, num processo de crescimento e desenvolvimento de uma sociedade inteira.
Nesse sentido, como você avalia a mercantilização do campo cultural?
A cultura enquanto mercado, “business”, é um aspecto adicional, que deve ser levado em conta do ponto de vista do entendimento; mas o compromisso de uma instituição voltada ao interesse público, como é o nosso caso e o caso daqueles que realizam suas ações na perspectiva de uma política cultural, é ético. O compromisso é com o desenvolvimento da sociedade e não com o “business da cultura”, com a “indústria cultural”, que tem sua importância, mas é algo complementar que está subordinado ao primeiro. Essa, para mim, é uma das questões fundamentais que deve ser levada em conta.
Pode haver indústria cultural? Sim, claro. Pode haver profissionais que ganhem dinheiro com cultura? Acho difícil, mas pode. Porém, ganhar dinheiro no sentido pura e simplesmente de um business, visando fortalecer o mercado e o enriquecimento individual de pessoas, nisso eu não acredito.
Entrevista realizada no dia 13 de maio de 2013, na Administração Central do Sesc de São Paulo.
(Foto: Fernanda Procópio)
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